sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Paulo Freire segundo a Veja

VIÚVA DE PAULO FREIRE ESCREVE CARTA DE REPÚDIO À REVISTA VEJA
por CONCEIÇÃO LEMES

Na edição de 20 de agosto a revista Veja publicou a reportagem O queestão ensinando a ele? De autoria de Monica Weinberg e Camila Pereira,ela foi baseada em pesquisa sobre qualidade do ensino no Brasil. Lápelas tantas há o seguinte trecho:

"Muitos professores brasileiros se encantam com personagens que emclasse mereceriam um tratamento mais crítico, como o guerrilheiroargentino Che Guevara, que na pesquisa aparece com 86% de citaçõespositivas, 14% de neutras e zero, nenhum ponto negativo. Ou idolatrampersonagens arcanos sem contribuição efetiva à civilização ocidental,como o educador Paulo Freire, autor de um método de doutrinaçãoesquerdista disfarçado de alfabetização. Entre os professores ouvidosna pesquisa, Freire goleia o físico teórico alemão Albert Einstein,talvez o maior gênio da história da humanidade. Paulo Freire 29 x 6Einstein. Só isso já seria evidência suficiente de que se está diantede uma distorção gigantesca das prioridades educacionais dos senhoresdocentes, de uma deformação no espaço-tempo tão poderosa, que talvezajude a explicar o fato de eles viverem no passado".

Curiosamente, entre os especialistas consultados está o filósofoRoberto Romano, professor da Unicamp. Ele é o autor de um artigopublicado na Folha, em 1990, cujo título é Ceausescu no Ibirapuera.Sem citar o Paulo Freire, ele fala do Paulo Freire. É uma tática deagredir sem assumir. Na época Paulo, era secretário de Educação daprefeita Luiza Erundina.
Diante disso a viúva de Paulo Freire, Nita, escreveu a seguinte cartade repúdio:

"Como educadora, historiadora, ex-professora da PUC e da Cátedra PauloFreire e viúva do maior educador brasileiro PAULO FREIRE -- e um dosmaiores de toda a história da humanidade --, quero registrar minhamais profunda indignação e repúdio ao tipo de jornalismo, que, a cadasemana a revista VEJA oferece às pessoas ingênuas ou mal intencionadasde nosso país. Não a leio por princípio, mas ouço comentários sobresua postura danosa através do jornalismo crítico. Não proclama suaopção em favor dos poderosos e endinheirados da direita, mas ,camufladamente, age em nome do reacionarismo desta.
Esta vem sendo a constante desta revista desde longa data: enodoarpessoas as quais todos nós brasileiros deveríamos nos orgulhar. Paulo,que dedicou seus 75 anos de vida lutando por um Brasil melhor, maisbonito e mais justo, não é o único alvo deles. Nem esta é a primeiravez que o atacam. Quando da morte de meu marido, em 1997, o obituárioda revista em questão não lamentou a sua morte, como fizeram todos osoutros órgãos da imprensa escrita, falada e televisiva do mundo,apenas reproduziu parte de críticas anteriores a ele feitas.
A matéria publicada no n. 2074, de 20/08/08, conta, lamentavelmentecom o apoio do filósofo Roberto Romano que escreve sobre ética,certamente em favor da ética do mercado, contra a ética da vida criadapor Paulo. Esta não é, aliás, sua primeira investida sobre alguém queé conhecido no mundo por sua conduta ética verdadeiramente humanista.
Inadmissivelmente, a matéria é elaborada por duas mulheres, que,certamente para se sentirem e serem parceiras do "filósofo" e aceitaspelos neoliberais desvirtuam o papel do feminino na sociedadebrasileira atual. Com linguagem grosseira, rasteira e irresponsável,elas se filiam à mesma linha de opção política do primeiro, falam emfavor da ética do mercado, que tem como premissa miserabilizar os maispobres e os mais fracos do mundo, embora para desgosto deles, estamosconseguindo, no Brasil, superar esse sonho macabro reacionário.
Superação realizada não só pela política federal de extinção dapobreza, mas , sobretudo pelo trabalho de meu marido – na qual estapolítica de distribuição da renda se baseou - que demonstrou ao mundoque todos e todas somos sujeitos da história e não apenas objeto dela.Nas 12 páginas, nas quais proliferam um civismo às avessas e a máapreensão da realidade, os participantes e as autoras da matéria dãocontinuidade às práticas autoritárias, fascistas, retrógradas da cataàs bruxas dos anos 50 e da ótica de subversão encontrada em todo atohumanista no nefasto período da Ditadura Militar.
Para satisfazer parte da elite inescrupulosa e de uma classe médiabrasileira medíocre que tem a Veja como seu "Norte" e "Bíblia", estamatéria revela quase tão somente temerem as idéias de um homemhumilde, que conheceu a fome dos nordestinos, e que na sua altivez edignidade restaurou a esperança no Brasil. Apavorada com o que Pauloplantou, com sacrifício e inteligência, a Veja quer torná-loinsignificante e os e as que a fazem vendendo a sua força de trabalho,pensam que podem a qualquer custo, eliminar do espaço escolar o que háde mais importante na educação das crianças, jovens e adultos: opensar e a formação da cidadania de todas as pessoas de nosso país,independentemente de sua classe social, etnia, gênero, idade oureligião.
Querendo diminuí-lo e ofendê-lo, contraditoriamente a revista Veja nosdá o direito de concluir que os pais, alunos e educadores escutaram avoz de Paulo, a validando e praticando. Portanto, a sociedadebrasileira está no caminho certo para a construção da autênticademocracia. Querendo diminuí-lo e ofendê-lo, contraditoriamente arevista Veja nos dá o direito de proclamar que Paulo Freire Vive!

São Paulo, 11 de setembro de 2008
Ana Maria Araújo Freire".

O Grande Chefe/ Lars von Trier


“O grande chefe” (2006), uma comédia de Lars Von Trier? O que será uma comédia de Lars Von Trier? Acostumada a debulhar-me em lágrimas com filmes como “Dançando no Escuro/ Dancing in the Dark” (2000) e “Ondas do Destino /Breaking the Waves” (1996) e ficar dias matutando sobre filmes como Maderlay (2005) e Dogville (2003), pensei comigo, será que ele sabe fazer comédia?

O filme certamente, não suscita gargalhadas intermitentes, mas com certeza, deixa o espectador grudado na trama com um sorriso maroto iminente.

O que tem de bom nos filmes do Lars Von Trier, na minha (leiga) opinião, é o elemento surpresa. A gente não consegue prever nada. O desenrolar da estória sempre vai por caminhos nunca imaginados. O inusitado começa pelos enredos.

Neste, o dono de uma empresa contrata um ator para fingir ser o presidente numa transação comercial complicada, a venda da companhia. O espectador não sabe por que diabos ele faz aquilo, mas o filme vai se mostrando (e dando) aos poucos. Na verdade, o dono da empresa, buscando ser amado por seus funcionários, cria esta figura hedionda, o grande chefe, que é quem toma todas as decisões antipáticas. Demite os funcionários; faz críticas, corte de salários e benefícios. Mas que, convenientemente, nunca está presente. Na verdade, com a comunicação virtual, não haveria necessidade de um presidente presente (e o filme pode ser visto por este prisma: o mercado de trabalho e as empresas no século XXI), mas a venda da empresa exige a sua assinatura, e é aí que o ator entra em cena.

O potencial comprador da empresa, um finlandês, e sua xenofobia contra os dinamarqueses e seu sentimentalismo, é um dos pontos altos do filme. (Li numa entrevista com o diretor, que os dinamarqueses adoram ser chamados de burros!) Assim, como toda a atuação do ator que faz o ator fazendo “o chefe”. Nota dez.

A única ressalva que eu faço é a uma voz de fundo, que parece ser a do diretor mesmo, que de tempos em tempos aparece para dar uma parada no ritmo da comédia. Eu não gostei ou não entendi, acho que não precisava. Pena eu não entender dinamarquês, imagino ter perdido muito com a tradução.

Outro fator comum aos filmes do enfant terrible do cinema dinamarquês é que os personagens centrais são geralmente bons e inocentes. Pelo menos, é assim à primeira mirada. Ao decorrer do filme eles cometem atrocidades, mas não por que quiseram, mas por que foram envolvidos pelo destino numa trama horrenda de sofrimento. São como os heróis da tragédia grega: não podem fugir das armadilhas do destino. São tomados, possuídos. Ao expectador, fica a perplexidade diante do espetáculo da vida.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Por que eu amo este país




Estou dando aulas de Português para dois irmãos australianos. Um deles, na faixa dos 35 anos de idade, é forte, bonito, de estatura mediana. O outro, de olhos azuis claros, tem menos de 18 anos. É magro. Eles vêm para a escola de moto, porque trazem sempre os capacetes a tiracolo.

A escola, onde eu ensino, não é barata. Ela é direcionada, sobretudo, ao público de empresas. O preço do curso é aproximadamente 150 GPB por mês, com duas aulas de duas horas por semana.

Ontem, na segunda aula, trabalhamos as profissões. Qual não foi a minha surpresa ao perguntar ao garoto magro qual a sua profissão. A resposta que eu ouvi, um tanto incredulamente, foi: peão de obra! Sorry. Can you repeat? Perguntei. Peão de obra. Isso mesmo. O seu irmão mais velho, também. Os meus alunos são trabalhadores da construção civil.

Quando, no nosso país, um peão de obra poderia sonhar em fazer um curso de línguas? Quando, em nosso país, ele poderia dispor de 150 GPB por mês para um passa-tempo cultural? É por isso que eu amo a Inglaterra.

A diferença entre o salário de um engenheiro civil (aliás, temos um engenheiro civil na mesma sala) não é estratosférica. O peão de obra pode sonhar em passar as férias de verão em uma praia paradisíaca no Nordeste do Brasil. Sonhar e realizar. As passagens dos dois irmãos já estão compradas. Em dezembro, eles vão para Natal.

Se há alguma razão para amar este país, sendo eu uma brasileira, ela está aí: aqui o peão de obra pode aprender uma língua estrangeira para não fazer feio no seu próximo destino internacional.






Na foto: A famosa foto dos trabalhadores almoçando sentados em uma viga durante a construção do edifício GE (antigamente chamado de RCA) em 1932, registrada por Charles C. Ebbets.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Obama é liberal!

O candidato democrata à presidência dos EUA cumprimenta a mulher do seu vice com um beijo na boca! O fato vem provar, caso vocês ainda não saibam, que Obama é liberal! Mas a pergunta que não quer calar é: por que ele não beijou o vice também?

http://www.youtube.com/watch?v=QzQg9U4BDrE

Castelo de Leeds / Leeds Castle


No sábado passado passamos um dia maravilhoso no Castelo de Leeds (Leeds Castle) que fica localizado no povoado de Leeds, em Kent, Inglaterra. Pegamos um trem pela manhã (10:18) e só voltamos para casa depois das 21:00. Estavámos em um grupo de sete pessoas: Shipra (indiana), Erlend (norueguês), Rafael (espanhol), Sofia (chilena), Niraj (inglês-indiano), Alexandre (francês-tunisiano) e eu, finalmente, Flávia (brasileira). Viajar de trem pela Inglaterra em grupo é uma boa maneira de economizar dinheiro: 4 pessoas pagam pelo preço de 2 e assim por diante. Da estação de trem Bearstead para o castelo, dividimos o taxi (3.45 GPB ida e volta/ pessoa), o que saiu mais barato que pegar o ônibus (5 GBP ida e volta/ pessoa).

Assim como quase todo mundo, levamos o nosso lanche e fizemos vários pequenos pequiniques durante o dia. Assim economiza-se na alimentação. O passeio pode até parecer caro. O preço do trem é 15.40 GPB partindo de London Bridge, o preço do ônibus 5 GPB e o preço para entrar no castelo e nos jardins é 15.00 GPB. Some alguma bebida quente ou fria, um sorvete ou um cerveja e vai mais 4.00 GPB. Vamos dizer uns 40 GBP sem contar o pequinique. Mas o ingresso do castelo e jardins pode ser reutilizado quantas vezes você quiser durante o prazo de um ano! E se você viajar em grupo, o bilhete de trem pode ser reduzido e, o optando pelo taxi, reduz-se o preço do transporte.

Fazia calor e sol, um dia tipicamente não-inglês e o resultado foi um nariz orgulhosamente vermelho ao chegar em casa. Quando faz sol em Londres as pessoas se sentem obrigadas a sair de casa e “mexer o seu traseiro gordo”, como diziam os saudosos Cacetas em outras épocas! Poucos têm coragem de ficar em casa em um dia de sol: nunca se sabe quando teremos outro!

O castelo, por dentro, é bonito, mas o que se vê, como turista, é como vive uma família de milionários. A visitação do castelo concentra-se nos cômodos onde viveram a família da Lady Baillie. Não deixa de ser interessante, mas não espere enveredar-se pelos caminhos incestuosos de Ana Bolena ou pelo gênio de Henrique VIII.

A visita vale mesmo pelos arredores do castelo. Tem caverna; labirinto; coleção de pássaros exóticos (como tucanos e araras!); cisnes e patos de toda qualidade de cor, jardins; lagos; riachos e riachinhos; horta; vinícula; falconaria; brinquedos de criança; e até um museu de coleira de cachorro (com exemplares do século XVII)! É diversão para a família toda!

O labirinto, por exemplo, eu recomendo para quem gosta de se perder. A experiência vale a pena se você não se sente a ponto de ter um ataque de nervos estando numa situação sem saída, como esta pobre infeliz que vos escreve... Eu quase tive um piti memorável (aliás, tive, mas prefiro não contar). De toda maneira, há um funcionário do castelo sentado (fazendo nada) no meio do labirinto. Eu não sabia deste detalhe. Se você entrar em pânico, sugiro que levante a mão e grite: “HELP”! Não grite, “socorro”, porque provavelmente ele não vai te entender e vai achar que você está se divertindo na companhia dos seus compatriotas. Caso contrário, provavelmente, você vai padecer perdido até que os corvos e os falcões da coleção do castelo te encontrem morto em alguns dias.

HISTÓRIA
A história mais remota do Leeds Castle tem início no ano de 857 com a construção de um solar Real chamado Esledes. Este foi pertença da Casa Real anglo-saxónica durante o reinado de Ethelbert de Wessex.


Construído em 1119 por Robert de Crevecoeur para substituir o anterior solar de Esledes, o castelo tornou-se num palácio Real para Eduardo I de Inglaterra e a sua rainha , Leonor de Castela, em 1278.


Em 1321, o Rei Eduardo II cercou o castelo depois de a sua esposa lhe ter impedido a entrada, tendo usado balistas para forçar os seus defensores a renderem-se. A primeira esposa do Rei Ricardo II, Ana da Boémia, passou o Inverno de 1381 no castelo durante a sua viagem para casar com o rei e, em 1395, o mesmo monarca recebeu ali o cronista francês Jean Froissart, tal como este descreve nas suas Crónicas.


Henrique VIII transformou o castelo para a sua primeira esposa, Catarina de Aragão.


O castelo escapou à destruição durante a Guerra Civil Inglesa porque os seus proprietários, a família Culpeper, estava do lado dos Parlamentaristas.


O último dono privado do castelo foi a Honorável Olive, Lady Baillie, uma filha de Almeric Paget, 1º Barão Queenborough e da sua primeira esposa, Pauline Payne Whitney, uma herdeira americana. Lady Baillie adquiriu o castelo em 1926, tendo redecorado o interior, inicialmente com a colaboração do arquitecto e designer francês Armand-Albert Rateau, o qual também supervisionou alterações exteriores, do mesmo modo que adicionou elementos interiores, tais como a escadaria ao estilo quinhentista em carvalho entalhado, e mais tarde com o decorador Stéphane Boudin, da Casa Jansen (Maison Jansen), uma firma de design de interiores de Paris que viria a ser responsável pelos chamados restauros Kennedy da Casa Branca. Baillie estabeleceu a Fundação do Leeds Castle, tendo o castelo sido aberto ao público em 1976.


Lady Baillie antes de morrer criou e doou o castelo e os jardins para a Fundação Leeds Castle (Leeds Castle Trust). Que mulher desapegada, pensaríam alguns! Que nada: tudo não passou de uma estratégia para não pagar imposto! Isto mesmo: o imposto de herança era de 80% do valor da propriedade. Assim, seria preciso vender o castelo para pagar o imposto. Por isso, a solução para manter, pelo menos, parte da propriedade, foi doar parte substancial para a Fundação, que haveria de cuidar de perpetuar a vida daquela família num castelo transformado em museu por todo o sempre. Boa jogada! Mas parece que o filho mais velho da família não ficou satisfeito com a decisão da mãe. As filhas, coitadas, já não tinha direito a nenhuma parte da fortuna, já que o direito aristocrático concede a herança ao filho varão apenas. (Não posso garantir a veracidade destas informações, já que foram obtidas através de conversas informais com os funcionários do castelo.)

Sobre o Rei Henrique VIII
Um filme chamado The Other Boleyn Girl ("A Outra Bolena") foi lançado no Brasil em 2008. Natalie Portman e Scarlett Johansson interpretarão Ana e Maria Bolena, respectivamente, e Eric Bana interpreta rei Henrique VIII. O filme foi dirigido por Justin Chadwick e o roteiro é de Peter Morgan. Vi o filme em Recife com a minha prima Sara e gostamos muito. É um daqueles filmes que realmente transportam o expectador para outra época histórica, com o auxílio de uma boa dose de traição, sensualidade, poder e muito investimento em figurino e locações.